Passado o momento de encantamento com empresas cuja defesa de justiça social e salvamento do planeta não ia além da propaganda, as companhias caem na real, apostam em ESG não apenas como um requisito de imagem, mas como uma estratégia essencial ao crescimento e à competitividade, enquanto buscam parceiros que auxiliem na tradução desses compromissos em resultados tangíveis para seus negócios e para a sociedade.
O enlevo com as práticas sustentáveis, com ações relacionadas aos campos ambiental, social e de governança (ESG, na sigla em inglês), criou uma “bolha” de comunicados sobre ações positivas de empresas de todos os campos. Mas os resultados são controversos e, na prática, ainda não chegam com clareza ao consumidor.
Muitas vezes com poucas ações concretas, algumas companhias começaram a tacar até obrigações legais na conta da sustentabilidade, como a contratação de um determinado percentual de pessoas com deficiência (PCDs). Outras se apresentaram como verdinhas e amantes da natureza enquanto provocavam desastres ecológicos. Mais algumas carregaram selos externos de sustentabilidade, mas promoveram verdadeiros golpes em investidores.
Com isso, o termo ESG ganhou espaço entre consumidores, embora seu significado não seja tão claro – tanto por conta da contradição entre discurso e prática quanto pela divulgação muitas vezes hermética por parte de empresas e marcas. Pesquisa da Ipsos no Brasil realizada em julho último (disponível aqui) mostra que só um a cada três brasileiros conhecem o termo. O índice é mais alto na classe A, com 62% de conhecimento. Entre os que conhecem a sigla 39% a relacionam com referências ao meio ambiente, 14% a reciclagem e 8% ao planeta e seu futuro.
Mas só um quinto dos entrevistados considera haver quantidade adequada de informação a respeito, com 56% apontando que existe pouca informação e que as empresas deveriam comunicar melhor seus projetos e 15%, que existe muita informação, mas é difícil distinguir o que uma empresa faz das outras.
Por outro lado, 96% dos brasileiros consideram o tema desenvolvimento sustentável importante para o país. Mas a visão do progresso da pauta no Brasil é majoritariamente negativa: 43% dos entrevistados consideram ruim ou muito ruim o cuidado ambiental por aqui e 39% têm a mesma opinião em relação à pauta de bem-estar social. A área onde foi registrado o maior avanço, segundo os consultados, é o acesso a medicamentos e vacinas mais eficazes (41%), reciclagem e reutilização de embalagens por parte das famílias (27%).
As empresas foram o grupo mais bem avaliado na tarefa de alcançar desenvolvimento sustentável no país (23%), contra 21% para famílias e 19% para o Estado. Mas 34% avaliam mal ou muito mal o desempenho das companhias. Além disso, 77% dos brasileiros acreditam que as empresas devem absorver o custo da sustentabilidade, sem repasse aos consumidores. Não por acaso, só 18% compram produtos ambientalmente responsáveis, mesmo custando um pouco mais – 57% só fazem a compra se o preço estiver bom e 25% sequer pensam nisso.
A pesquisa mostra como a comunicação pode facilitar (ou complicar) o processo. Em entrevista recente ao jornal Valor Econômico, Flávia Martins, diretora de marketing do Pacto Global da ONU – Rede Brasil, lembrou que a sustentabilidade hoje é intrínseca à operação das empresas, já que não há negócios sem planeta e população saudáveis. Mas exige comunicação adequada.
“A função da comunicação e do marketing das empresas terá de ir além de embalar produtos e discursos bonitos. É preciso ser defensor de uma narrativa que se alie à prática”, defendeu.
Um dos motivos da incerteza em relação ao ESG, segundo ela, foi a prática de greenwashing, com uso de informações falsas ou dúbias sobre o tema. A atitude não ajudou em nada quem leva o tema a sério. Afinal, se uma empresa que se diz verdinha é capaz de provocar tragédias ambientais fica complicado entender o que é ou não é ESG.
O cenário expõe a responsabilidade da comunicação, que vai muito além de expor as boas ações de empresas ou marcas. Aliás, pode começar ainda antes, ajudando a detectar ações já em prática e ainda não bem percebidas. Além disso, pode apontar oportunidades de melhoria relacionadas às questões ESG e estimular a aderência da empresa à sustentabilidade como um de seus valores estratégicos.
Outro papel essencial é “traduzir” iniciativas de impacto positivo para os diferentes públicos. Governança ilibada vai significar mais para investidores do que para donas-de-casa, enquanto a facilidade de reciclar embalagens sem custo extra pode ser mais atraente para consumidores. Levar a mensagem certa para cada público é essencial quando a companhia está aderente ao tema de corpo e alma.
Por fim, e não menos importante, é o papel crítico que a comunicação pode assumir. Será que um determinado elemento é mesmo aderente à pauta ESG? Deixa algum passivo ou ponta solta? Um olhar externo, imparcial e que vá além da autopromoção é capaz de assegurar a autenticidade da prática ESG, o que fortalece a reputação e maximiza o valor de marca. Empresas que almejam vantagem competitiva por meio do ESG precisam de parceiros que colaborem na identificação de oportunidades para avançar, minimizando riscos de imagem e criando um ciclo positivo de valorização junto a consumidores, investidores e sociedade.
Mestre em Comunicação pela UNIP, pós-graduada em Marketing pela ESPM e Flórida International University, com mais de 25 anos de experiência no mercado atuando, principalmente, nas áreas de Planejamento, Marketing e Comunicação em diversos perfis de empresas. Professora e Palestrante para cursos de graduação e pós-graduação. É coautora do Livro: Um Profissional para 2020 – Editora B4.